Bolsonaro manda repórteres calarem a boca e nega interferĂȘncia na PF

Por: Folhapress O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) mandou repórteres calarem a boca na manhã deste terça-feira (5) quando foi questionado sobre as recentes mudanças

Por João Paulo Pereira em 05/05/2020 às 15:19:16
Por: FolhapressO presidente Jair Bolsonaro (sem partido) mandou repórteres calarem a boca na manhã deste terça-feira (5) quando foi questionado sobre as recentes mudanças na PolĂ­cia Federal. Bolsonaro ainda atacou a Folha de S.Paulo, chamando o jornal de "canalha", "patife" e "mentiroso". Em declaração pela manhã em frente ao PalĂĄcio da Alvorada, Bolsonaro mostrou uma imagem que reproduzia a manchete da edição imprensa da Folha de S.Paulo desta terça-feira e, referindo-se à manchete "Novo diretor da PF assume e acata pedido de Bolsonaro", disse que interferiu na corporação. "Que imprensa canalha a Folha de S.Paulo. Canalha Ă© elogio para a Folha de S.Paulo. O atual superintendente do Rio de Janeiro, que o [ex-ministro Sergio] Moro disse que eu quero trocar por questões familiares." "Não tem nenhum parente meu investigado pela PolĂ­cia Federal, nem eu nem meus filhos, zero. Uma mentira que a imprensa replica o tempo todo, dizer que meus filhos querem trocar o superintendente [da PF no Rio]", completou o presidente. Nomeado um dia antes, o novo diretor-geral da PolĂ­cia Federal, Rolando Souza, decidiu trocar a chefia da SuperintendĂȘncia da PF no Rio de Janeiro, foco de interesse da famĂ­lia de Jair Bolsonaro. Carlos Henrique Oliveira, atual chefe da PF no estado, foi convidado para ser o diretor-executivo, nĂșmero dois na hierarquia do órgão. Durante sua fala, Bolsonaro foi questionado por jornalistas se havia pedido a mudança na superintendĂȘncia da PF no Rio. Foi aĂ­ que ele disse para os profissionais calarem a boca. "Cala a boca, não perguntei nada", respondeu a um primeiro questionamento, feito por uma repórter de O Estado de S. Paulo. "Folha de S.Paulo, um jornal patife e mentiroso". Questionado em seguida pela Folha, o presidente gritou novamente: "cala a boca, cala a boca". Moro disse em sua despedida que Bolsonaro queria trocar o diretor-geral para interferir politicamente na polĂ­cia. O ex-ministro afirmou tambĂ©m que o presidente queria mudanças no Rio e em Pernambuco. Como mostrou o Painel, da Folha, Alexandre Ramagem, que teve a nomeação suspensa pelo STF (Supremo Tribunal Federal), tambĂ©m jĂĄ tinha decidido trocar o comando da PF no Rio. Neste terça-feira, para rechaçar que teria promovido ingerĂȘncia na PF, Bolsonaro disse que Carlos Henrique Oliveira serĂĄ diretor-executivo da corporação, o "zero dois" da estrutura da polĂ­cia. "Para onde ele [Oliveira] estĂĄ indo? Para ser diretor-executivo da PolĂ­cia Federal. Ele vai sair da superintendĂȘncia -são 27 superintendĂȘncias- para ser diretor-executivo. Eu tô trocando ele? Eu tô tendo influencia sobre a PolĂ­cia Federal? Isso Ă© uma patifaria", afirmou. "[Ele] estĂĄ saindo de lĂĄ [RJ] para ser diretor-executivo a convite do atual diretor-geral. Não interferi nada. Se ele fosse desafeto meu e, se eu tivesse influĂȘncia na PolĂ­cia Federal, ele não iria para lĂĄ. Não tenho nada contra o superintendente do Rio de Janeiro e não interfiro na PF." POSSE DE ROLANDO O termo de posse de Rolando no comanda PF foi assinado em uma cerimônia reservada no gabinete do presidente, cerca de dez minutos após a publicação. Auxiliares de Bolsonaro disseram que a posse-relâmpago foi para agilizar o processo e não deixar a PF sem comando por mais tempo. Na semana passada, Alexandre Ramagem, amigo da famĂ­lia do presidente, teve a nomeação suspensa por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal). Bolsonaro chegou a dizer que iria recorrer, mas não apresentou nenhum ato jurĂ­dico formal sobre o assunto atĂ© o momento. Foi Ramagem o responsĂĄvel pela indicação de Rolando. Eles trabalharam juntos nos Ășltimos meses na Abin. De acordo com auxiliares do presidente ouvidos pela Folha, Bolsonaro foi aconselhado a ter pressa para escolher um novo nome para o órgão após a decisão de Moraes. Na avaliação de ministros do Supremo, a presença do presidente no ato antidemocrĂĄtico do domingo (3) foi um aceno para seguidores. A leitura Ă© a de que foi uma tentativa de passar a mensagem de que Ă© ele quem manda e que não admitiria uma segunda anulação de sua nomeação. No entanto, dentro da corte, a opinião majoritĂĄria Ă© de que não haveria nenhuma possibilidade de suspender a escolha de Rolando, que Ă© diferente da primeira. Moraes se baseou especificamente no fato de uma investigação ter sido aberta para apurar as acusações feitas por Moro e que envolviam Ramagem, como o escolhido por Bolsonaro para ter mais controle na PF. A PGR (Procuradoria-Geral da RepĂșblica) solicitou nesta segunda (4) diligĂȘncias no inquĂ©rito conduzido por Celso de Mello. Entre as medidas, Augusto Aras pede depoimentos de cinco delegados, entre eles Carlos Henrique Oliveira, Ramagem e MaurĂ­cio Valeixo, ex-diretor-geral. De novo centro das atenções, o Rio foi pivô da primeira crise envolvendo a PF e Bolsonaro. Em agosto do ano passado, o presidente atropelou a cĂșpula e anunciou a troca do chefe do Rio, que era Ricardo Saadi. Depois, Bolsonaro chegou a dizer que Alexandre Saraiva, superintendente do Amazonas, assumiria o comando no local. Em dezembro, enfim, com a situação aparentemente mais tranquila, Carlos Henrique, que era o nome defendido pela direção da PF na Ă©poca, assumiu o Rio. Nem seis meses depois, no entanto, deve se mudar novamente, se aceitar o convite de Rolando. A preocupação com investigações sobre sua famĂ­lia, desconhecimento sobre processos, sĂ­ndrome de perseguição, inimigos polĂ­ticos e fake news são alguns dos pontos elencados por pessoas ouvidas pela Folha para tentar explicar a obsessão do presidente com o Rio. Sua candidatura em 2018 o colocou como muito próximo dos bastidores da PF, por ter sua segurança feita pelo órgão -Ramagem chegou a coordenar uma das equipes, após a eleição, a partir do fim de outubro daquele ano. Segundo relatos, bastidores da SuperintendĂȘncia da PF no Rio, intrigas entre grupos e outras ocorrĂȘncias passaram a chegar rapidamente a Bolsonaro desde a campanha. Depois, as relações foram mantidas, e os assuntos viraram mais importantes, principalmente após vir à tona a investigação de seu filho FlĂĄvio e tambĂ©m pelo fato de seu mandato ter começado. A presença ou ausĂȘncia do chefe da PF no edifĂ­cio do órgão era motivo de perguntas por parte do presidente, por exemplo. Funções de delegados especĂ­ficos tambĂ©m viravam alvo de reclamações de Bolsonaro. Mais recentemente, no episódio envolvendo o porteiro, o presidente chegou a insinuar que o ocorrido era parte de um plano do governador Wilson Witzel (PSC-RJ). Antes aliados, os dois viraram inimigos polĂ­ticos desde o final do ano passado. A partir disso, nos bastidores, Bolsonaro reclamava de que o adversĂĄrio não virava alvo de investigações. Seus contatos na PF tambĂ©m inflamavam a irritação, dizendo que tipo de apuração poderia vir a ser feita para atender os anseios do presidente e espalhavam que os trabalhos não andavam como deveriam. AtĂ© um despacho de um delegado em um caso que envolvia supostamente um aliado de Bolsonaro, o deputado federal HĂ©lio Negão (PSL-RJ), virou um dos ingredientes da crise. O documento recuperava casos de anos anteriores para levantar a possibilidade de um homem citado no inquĂ©rito ser, na verdade, o parlamentar. Em seguida, no entanto, dizia que não era, mas mandara o caso para os órgãos de inteligĂȘncia e tambĂ©m decretara sigilo -dois procedimentos considerados fora do padrão para o tipo de investigação. A desconfiança da cĂșpula da polĂ­cia era que se tratava de uma fraude, com o objetivo de gerar desconfiança na PF do Rio. Como mostrou o Painel, Alexandre Ramagem, que teve a nomeação suspensa pelo STF (Supremo Tribunal Federal), tambĂ©m tinha decidido trocar o Rio. Investigações que envolvem entorno de Bolsonaro Fake news Em março de 2019, o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, anunciou a abertura de um inquĂ©rito para investigar a existĂȘncia de fake news que atingem membros da corte. Paralelamente, em setembro do mesmo ano, a CPMI das Fake News foi instaurada no Congresso. Desde então, a famĂ­lia Bolsonaro tem se colocado contrĂĄria ao funcionamento da comissão, que investiga perfis que fazem parte do arco de apoio do presidente da RepĂșblica. No final de abril, a Folha revelou que a PF identificou o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro, como um dos articuladores de um esquema criminoso de fake news. Dentro da PolĂ­cia Federal, não hĂĄ dĂșvidas de que Bolsonaro quis exonerar o ex-diretor da PF MaurĂ­cio Valeixo, homem de confiança de Sergio Moro, porque tinha ciĂȘncia de que a corporação havia chegado ao seu filho. ATOS PRÓ-GOLPE O ministro Alexandre de Moraes, do STF, autorizou a abertura de inquĂ©rito para investigar os atos do dia 19 de março. O pedido foi feito pelo procurador-geral da RepĂșblica, Augusto Aras. O objetivo Ă© apurar possĂ­vel violação da Lei de Segurança Nacional por "atos contra o regime da democracia brasileira". A investigação mira empresĂĄrios e ao menos dois deputados federais bolsonaristas, Daniel da Silveira (PSL-RJ) e Cabo Junio Amaral (PSL-MG), por, possivelmente, terem organizado e financiado os eventos. Na mira da PF tambĂ©m estão youtubers bolsonaristas que chamaram pĂșblico para os atos. Bolsonaro, que participou dos protestos em BrasĂ­lia, não serĂĄ investigado, segundo interlocutores do procurador-geral. Eles alertam, porĂ©m, que, caso sejam encontrados indĂ­cios de que o chefe do Executivo ajudou a organizĂĄ-los, ele pode vir a ser alvo. CASO QUEIROZ Em agosto de 2019, Bolsonaro anunciou que trocaria o então superintendente da PF no Rio, Ricardo Saadi, por questões de gestão e produtividade. A corporação passava por momento delicado, após vir à tona o caso FabrĂ­cio Queiroz, policial aposentado e ex-assessor do hoje senador FlĂĄvio Bolsonaro (Republicanos-RJ) na Assembleia do Rio. Ele Ă© o pivô da investigação do MinistĂ©rio PĂșblico que atingiu o primogĂȘnito do presidente. Relatório federal apontou a movimentação de R$ 1,2 milhão na conta de Queiroz, de janeiro de 2016 a janeiro de 2017. A suspeita Ă© de que o dinheiro seja de um esquema de "rachadinha" -quando funcionĂĄrios são coagidos a devolver parte de seus salĂĄrios aos deputados. Nomeado nesta segunda-feira (4) pelo presidente Bolsonaro, o novo diretor-geral da PF, Rolando Alexandre de Souza, decidiu trocar a chefia da corporação no Rio.
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